Detenção de Imamoglu: Erdogan abandona política da "cenoura e do pau" e adota uma abordagem mais radical

A Turquia está a assistir a uma mudança acentuada na abordagem do presidente Recep Tayyip Erdogan, que abandonou a sua estratégia anterior, que combinava pressões e concessões, em favor de uma política rigorosa baseada na repressão política e no reforço da segurança.
O presidente da Câmara de Istambul, Ekrem Imamoglu, uma das figuras mais proeminentes da oposição, foi detido sob a acusação de corrupção e de colaboração com o que o Governo descreve como terroristas.
A detenção representa uma escalada importante contra a oposição, que a descreveu como um "golpe político" destinado a eliminar Imamoglu da próxima corrida eleitoral, que poderia ser um candidato forte e um opositor formidável, uma vez que o cenário ficou praticamente desprovido de qualquer pessoa suscetível de ameaçar o governo do presidente Erdogan após a morte do seu pior inimigo nos últimos anos, Fethullah Gulen, que morreu no outono passado no seu exílio nos Estados Unidos.
Os seus apoiantes consideram que o caso tem motivações políticas e visa neutralizá-lo da cena política, especialmente depois de a sua popularidade ter aumentado na sequência do seu sucesso na gestão do município de Istambul e de se ter apresentado como uma forte alternativa a Erdogan. Esta escalada é suscetível de reforçar a posição de Imamoglu como símbolo da oposição, o que poderia desafiar ainda mais o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) no poder.
Os curdos e a política da mão estendida
Entretanto, o Governo turco continua a lidar com a questão curda com mão de ferro. Embora o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) tenha anunciado a sua vontade de se desarmar como um passo para a paz, Erdogan não mostrou qualquer interesse nesta iniciativa, o que reflecte a ausência de qualquer intenção oficial de resolver politicamente o conflito.
O Partido Democrático Popular (DEM), pró-curdo, sublinhou que o governo não tomou quaisquer medidas concretas para a reconciliação, o que reflecte a continuação da política de segurança de linha dura.
A Turquia e a queda de Assad
Paralelamente a estes acontecimentos, Erdogan ganhou nos últimos acontecimentos regionais a chegada de aliados ao poder na vizinha Síria, depois de anos de apoio à oposição armada naquele país, e depois de no ano passado a opção turca naquele país ter parecido estar à beira da extinção e a pressão se ter deslocado de Damasco para Ancara, uma vez que os governos árabes do Golfo se mostraram abertos a reabrir as suas embaixadas ao regime de Bashar al-Assad.
Num momento regional extraordinário, Erdogan apoiou uma nova dinâmica que resultou no derrube do regime de Assad e na entrada de grupos armados em Damasco, liderados por Abu Mohammed al-Joulani, o líder do Hay'at Tahrir al-Sham (HTS). Ahmad al-Shara'a (anteriormente al-Joulani) tornou-se o presidente transitório da nova autoridade na Síria, cuja direção da política externa está claramente alinhada com a de Erdogan.
Apesar disso, a situação interna da Turquia manteve-se tensa, num contexto de polarização política crescente, de indicadores económicos instáveis e de queda contínua da lira turca nos mercados. A repressão de Erdogan contra a oposição abalou a frágil estabilidade a que o país assistiu nas últimas semanas.
A nível internacional, Erdogan parece sentir-se encorajado pelo apoio do antigo Presidente dos EUA, Donald Trump, e pelas recentes mudanças no processo sírio, onde reforçou a influência turca em detrimento dos curdos, após a retirada das forças norte-americanas de algumas zonas. Estes factores tornaram Erdogan mais confiante na imposição da sua agenda a nível interno e externo, sem necessidade de fazer concessões.
Estes desenvolvimentos indicam que Erdogan abandonou completamente a abordagem "pau e cenoura", que utilizava anteriormente para equilibrar a sua política, e confia agora apenas no "pau" para confrontar os seus opositores, quer dentro quer fora da Turquia, o que pressagia mais tensões políticas e sociais na próxima fase.
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