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Folia, matrafonas e 50 anos de liberdade no Carnaval de Torres Vedras

• Mar 5, 2025, 5:48 PM
7 min de lecture
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Chegou ao fim aquele período do ano em que podemos ser quem nós quisermos - astronauta, polícia, super-herói, personagem de filmes de aventuras - ou, porque não, alguém do sexo oposto - sem que ninguém nos olhe de esguelha por causa disso. Porque, todos sabemos, no Carnaval tudo é permitido.

É uma tradição com vários séculos, sobretudo nos países católicos, que nos dias que antecedem o início da Quaresma podemos dar largas à folia. Em Torres Vedras, cidade com cerca de 28 mil habitantes a menos de uma hora da capital portuguesa Lisboa, a tradição remonta ao século XVI, mas foi em 1923 que o Carnaval começou a ser festejado de forma oficial e organizada, sendo hoje, pouco mais de 100 anos depois, o mais famoso e frequentado de todo o país.

Essa fama deve-se, sobretudo, à sua particularidade. Se os Carnavais com inspiração brasileira polulam por Portugal inteiro, o Carnaval de Torres Vedras manteve-se fiel às raízes bem portuguesas. Em 1924, um ano depois da primeira eleição do Rei do Carnaval, decidiu-se eleger também uma Rainha - e que essa Rainha seria, igualmente, um homem. Desde então, as matrafonas - homens vestidos de mulher de forma tosca e hilariante - tornaram-se na figura central desta celebração.

"Toda a gente conhece o Carnaval de Torres Vedras como sendo um Carnaval especial, que não tem nada a ver com os desfiles brasileiros nem com todas essas importações", diz à Euronews a presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Laura Rodrigues. "Este é um Carnaval que vem das raízes rurais do Entrudo".

As matrafonas são figuras centrais no Carnaval de Torres Vedras
As matrafonas são figuras centrais no Carnaval de Torres Vedras Ricardo Figueira / Euronews

Se todos os anos há um tema, este ano a organização decidiu, após uma votação nas redes sociais, celebrar os 50 anos da revolução de 25 de Abril de 1974 - ou não fosse esta, afinal, uma celebração da liberdade. As figuras evocativas deste episódio histórico foram uma constante nos grupos organizados de mascarados que desfilaram no "corso trapalhão" de sábado à noite e voltaram a desfilar na terça-feira juntamente com os carros alegóricos.

"No início, tivemos receio que fosse um tema difícil de tratar em termos de máscaras", diz Laura Rodrigues. "Depois, vimos que foram feitas máscaras do mais diversificado e criativo que há, desde o lápis azul (representativo da censura que existia durante o Estado Novo) às pombas e às gaiolas. Ainda bem que foi escolhido este tema, porque é mais uma forma de reafirmar a importância do 25 de Abril nas nossas vidas e a liberdade que passámos a ter - parte da qual não seria visível neste Carnaval se o 25 de Abril não tivesse existido", acrescenta a presidente da Câmara.

Gilberto Fonseca apresenta-se vestido a rigor, com um cravo vermelho na mão e uma faixa que diz "Miss Matrafona" e dá-nos a sua opinião sobre o tema deste ano: "É uma maneira de relembrar o que aconteceu em 1974, mas não é um tema fácil, porque há muita gente a favor e muita gente contra", diz, no país que elegeu 50 deputados da extrema-direita nas últimas eleições legislativas.

A crítica política é, aliás, um elemento central deste Carnaval, com os muitos carros alegóricos que desfilam no corso principal de terça-feira à tarde a representarem - ou a ridicularizarem - as figuras que marcam a situação política nacional e internacional.

A crítica política é uma constante no Carnaval de Torres Vedras
A crítica política é uma constante no Carnaval de Torres Vedras Ricardo Figueira / Euronews

Tudo isto implica um grande investimento de tempo e trabalho, como conta Marta Coelho, membro da equipa de organização: "Uma das primeiras coisas que fazemos é selecionar os carros alegóricos, o que é feito em setembro. A partir do final do ano, começamos a coordenar-nos com os grupos de mascarados que vão desfilar. Então eles começam a criar os fatos de acordo com o tema. Temos ainda que nos coordenar com as oito associações carnavalescas que participam. É um processo que leva muito tempo".

A organização estima ter tido, este ano, cerca de meio milhão de visitantes.