Descobrir Portugal de autocaravana: de Lisboa ao Algarve em 20 dias

Um jornalista passou 20 dias a percorrer Portugal de autocaravana, tendo começado por Lisboa e depois passado pela costa sudoeste, incluindo a Costa Caparica e a Costa Vicentina, e o Algarve, no sul do país.
Cerca de 18% dos quase três milhões de proprietários de autocaravanas na Europa vão viajar para Portugal este verão, de acordo com a Camping-Car Park, a rede europeia de Áreas de Serviço para Autocaravanas (ASA).
Portugal, que tem 13.000 autocaravanas registadas, tem atraído cada vez mais turistas europeus que gastam em média 52 euros por noite. São sobretudo espanhóis, franceses, italianos e alemães que passam pelo menos três semanas a percorrer o país, de junho a setembro inclusive.
Lisboa, o ponto de partida
O abaixo-assinado é um deles que, após mais de seis horas de viagem desde Madrid, chega a Lisboa para iniciar o percurso. A entrada na cidade é bastante caótica, com muito trânsito e pouca paciência por parte dos condutores.
Se conduzir uma autocaravana nas grandes cidades já é complicado, aqui parece uma missão impossível. Estacionar relativamente perto do centro e em segurança é também uma odisseia. Na aplicação de estacionamento park4night que todos os autocaravanistas que se prezam têm, há muitos pontos, mas poucos deles são convincentes.
No final, será num parque pago junto à imponente e barulhenta Ponte 25 de abril, com dois quilómetros de extensão, um ícone da cidade que se ergue sobre o estuário do Tejo sob o olhar atento do Cristo Rei, a estátua do Redentor com 28 metros de altura (110 com o pedestal de 82 metros) e de braços abertos.
A melhor maneira de visitar os arredores da capital é de bicicleta: o Padrão dos Descobrimentos, a Torre de Belém (em construção), o Mosteiro dos Jerónimos, o bairro histórico e a Pastelaria de Belém, onde pode saborear aqueles bolos de creme quentinhos com um pouco de açúcar e canela em pó.
O centro de Lisboa é facilmente acessível de metro ou comboio. É uma cidade aberta e acolhedora e um caldeirão de culturas. Ainda mais no verão, quando o calor sufocante não impede que se desfrute do local. Muitas pessoas dão um mergulho no rio para se refrescarem do calor. Há muito para ver e visitar.
A vista panorâmica da cidade a partir do Castelo de S. Jorge é espetacular; passear pelo centro histórico é uma delícia; deixar-se levar pela cultura e pela música do Chiado, o bairro mais boémio, com o histórico Café a Brasileira, que alberga a estátua de Fernando Pessoa no seu terraço, é inebriante; as suas praças, como a Praça do Comércio, o antigo porto principal do comércio marítimo, com belas vistas para o Tejo; a sua catedral ou miradouros como o da Graça ou o de São Pedro de Alcântara também merecem uma visita.
O que a maioria dos quase 19 milhões de turistas que visitam a cidade todos os anos não perdem é o elétrico 28, que atravessa vários bairros serpenteando por ruas estreitas e encostas, ou o Elevador de Santa Justa, que liga a Baixa ao bairro alto.
Costa Caparica, a praia de Lisboa
De volta à estrada, a ideia é percorrer toda a costa sudoeste de Portugal, começando na Costa Caparica, a 20 minutos da capital, a sul do estuário do Tejo. São 15 quilómetros de praias de areia dourada e águas frescas do Atlântico, onde se podem ver famílias, surfistas, naturistas, turistas locais e estrangeiros.
É a praia de Lisboa por excelência, com bares de praia, música ao vivo e esplanadas ao pôr-do-sol. É o caso da Praia de São João ou da Praia Nova; quanto mais a sul, mais naturista e selvagem, embora todas sejam muito extensas e bonitas. Depois de alguns dias, a próxima paragem é Setúbal, a 50 quilómetros de Lisboa, rodeada pelo Parque Natural da Arrábida, uma área protegida com a costa mais espetacular do país. Em toda esta área, as autocaravanas não são permitidas na costa, embora durante o dia possa estacionar a sua campervan e desfrutar das vistas deslumbrantes (este será o denominador comum ao longo de toda a viagem pela costa de Vicenza).
Uma das mais belas praias da Europa, a Praia de Galapinhos, com a sua beleza natural e águas azul-turquesa, situa-se nesta zona. A região de Setúbal é ideal para os viajantes itinerantes, pois combina mar, serra e autenticidade, embora o estacionamento seja um pouco complicado.
A partir de Setúbal pode chegar-se de ferry à península de Tróia, uma extensão de areia branca e fina, águas limpas e calmas e muito vento. É um bom ponto de partida para iniciar o percurso pela costa alentejana ou vicentina, pois está ligada à Comporta, a nossa próxima paragem, destino de férias de artistas, designers e celebridades internacionais.
Não confundir com Sines, 55 quilómetros mais abaixo na costa, uma cidade industrial conhecida por ser o local de nascimento do explorador Vasco da Gama, o navegador que descobriu o caminho marítimo para a Índia. O seu castelo medieval e o museu adjacente contam a história desta figura-chave da Era dos Descobrimentos.
Natureza selvagem
A partir de Sines, a paisagem muda completamente, com falésias escarpadas, praias selvagens e aldeias pitorescas. A primeira que nos agarra é Porto Covo, uma pequena aldeia de casas brancas com riscas azuis num ambiente tranquilo, com um forte sabor local ideal para se desligar do ritmo urbano.
As suas grandes jóias são as suas enseadas aninhadas entre falésias: a Praia da Samoqueira é a mais impressionante, com formações rochosas, falésias e recantos escondidos. Este é um local muito procurado pelos viajantes em viagem e é ideal para desfrutar do mar e da paisagem deslumbrante. A Praia Grande, que é maior, também merece uma visita. Ao largo da costa, pode visitar-se de barco a Ilha do Pessegueiro, uma ilha histórica com uma antiga fortaleza.
Com a impressão de que pode superar o que vimos até agora, chegamos à Praia do Malhão, entre Porto Covo e Vila Nova de Milfontes, no concelho de Odemira. Rodeada de dunas naturais, a paisagem é preservada e deslumbrante, com o som constante das ondas e do vento do mar. É o paraíso dos surfistas. É como um canto esquecido do mundo, embora a presença de dois guardas a cavalo a lembrar que não se pode estacionar na zona mais próxima da praia nos traga de volta à realidade.
Depois de tanta natureza selvagem, Vila Nova de Milfontes apresenta-se como um local mais turístico. É um destino muito procurado pelos portugueses que desfrutam das suas tranquilas praias fluviais, como a Praia da Franquia, ideal para famílias, desportos náuticos e banhos seguros.
Sensações fortes
Depois da descontração, voltamos às emoções no Cabo Sardão, com as suas imponentes falésias de 40 a 50 metros de altura que evocam paisagens de filmes como "O Senhor dos Anéis" e "A Guerra dos Tronos". É uma paragem obrigatória na costa vicentina, onde se podem observar cegonhas brancas, falcões peregrinos e veados marinhos, entre outras espécies.
Outro destino a não perder é a Zambujeira do Mar, que também preserva a sua identidade de vila piscatória com pequenas casas brancas com riscas azuis, um porto tradicional entre falésias e restaurantes onde se pode comer peixe fresco. A sua praia urbana é ampla e tem boas vistas para o Atlântico.
Na nossa descida pelo sudoeste de Portugal, deparamo-nos com a Praia de Odeceixe, uma das praias mais singulares do país, mesmo na fronteira com o Algarve. A praia está situada na foz do rio Seixe, que separa o Alentejo do Algarve.
Esta confluência cria uma curiosa língua de areia em forma de ferradura, com uma parte banhada pelo oceano e a outra pelas águas do rio. Logo no local onde se encontram, cria-se uma corrente que faz as delícias de miúdos e graúdos que se deixam levar rio abaixo. A praia é rodeada por altas arribas verdes de onde se pode contemplar a fusão do mar e do rio.
No barlavento algarvio, no concelho de Aljezur, passámos uma manhã na Praia de Monte Clérigo, uma praia muito acessível ao pé de um pequeno núcleo de casas brancas e cor-de-rosa com um ar de praia. À tarde, outra das jóias da costa algarvia e vicentina, a praia da Carrapateira ou Praia da Bordeira.
Com mais de três quilómetros de extensão, é uma das maiores praias do Algarve e um dos destinos preferidos dos surfistas devido às suas ondas constantes. De facto, a costa avisa que é perigosa para os banhistas. Antes de chegar à praia, há uma lagoa de águas calmas onde as crianças brincam. Por detrás do areal, existem grandes dunas naturais onde esvoaçam centenas de gaivotas.
Nesta zona há uma grande afluência de autocaravanas e os parques de estacionamento devem ser reservados com antecedência, caso contrário não se consegue encontrar um lugar. "Em todo o Algarve, há problemas de estacionamento e de pernoita devido à grande afluência de pessoas", alertou-me um autocaravanista de Sevilha, dizendo que este ano há mais restrições para pernoitar do que no passado.
Vamos assistir à sobrelotação turística que, nesta altura do ano, se regista sempre no Algarve e veremos que as paisagens naturais e selvagens, com praias espaçosas e desertas da costa vicentina, foram deixadas para trás para dar lugar ao turismo de massas.
O fim do mundo
O Cabo de São Vicente, um dos locais mais emblemáticos do sul de Portugal, é igualmente turístico. Trata-se de um dos pontos mais ocidentais da Europa continental, considerado durante séculos como "o fim do mundo". Possui imponentes falésias com mais de 60 metros de altura, vistas panorâmicas sobre o mar alto e o mais belo pôr-do-sol da Europa. Aqui o vento sopra forte enquanto dezenas de turistas imortalizam o momento.
Muito perto do Cabo de São Vicente encontra-se uma das melhores praias desta zona, a Praia do Beliche. É uma enseada isolada e escarpada, protegida por altas arribas que lhe conferem um microclima mais quente. É uma praia de postal ilustrado. O seu acesso é feito através de escadas escavadas na rocha, fáceis de descer mas difíceis de subir. Aninhado nas rochas há um bar de praia em madeira com sardinhas assadas e frango grelhado.
Algarve: Turismo de massas
Continuando a nossa rota pelo Algarve, chegamos a Lagos, uma cidade popular entre os turistas de toda a Europa. A visita à Ponta da Piedade, uma formação rochosa famosa pelas suas falésias, grutas e águas azul-turquesa, é obrigatória. Trata-se de uma das paisagens costeiras mais fotogénicas da Europa. Está, naturalmente, repleta de turistas que procuram sombra entre as rochas da enseada, cujas águas estão cheias de algas aquando da nossa visita.
A próxima paragem é Portimão, uma das maiores cidades do Algarve, com um porto ideal para passeios de barco ao longo da costa sul. Embarcamos num para visitar as grutas e algares, num passeio de duas horas que passa pelas grutas do Algar (Carvoeiro), Praia da Marina, Praia do Carvalho e a famosa gruta de Benagil, com uma claraboia por onde a luz do sol entra e cria um efeito mágico no interior, iluminando a areia dourada e as paredes alaranjadas.
Depois da visita, um merecido mergulho no mar mesmo em frente com um mergulho do barco é a nossa recompensa. No regresso, a animada Praia da Rocha espera-nos.
Uma viagem de 45 minutos leva-nos a Albufeira, a meca turística da região. A tranquilidade e a calma dão lugar à azáfama e ao turismo de massas. Os ingleses tomaram conta desta cidade, que tem belas praias, incluindo a urbana Praia do Túnel, à qual se acede a partir da cidade velha através de um túnel escavado na rocha.
Depois da tempestade, vem a calma na forma de Faro,** a capital mais calma e descontraída do Algarve, com um centro histórico rodeado por muralhas mouras e romanas. A cidade é adjacente ao Parque Natural da Ria Formosa, uma das zonas húmidas mais importantes da Europa, com ilhéus, pântanos e canais para explorar.
Tavira, a jóia desconhecida do Algarve
Nos últimos dois dias, descobrimos uma verdadeira jóia do Algarve, Tavira. Não tão conhecida como outras cidades, é perfeita para uma paragem relaxante na nossa roadtrip. É histórica e elegante. Tem um forte passado romano, islâmico e cristão. As suas casas brancas com telhados de duas águas, as ruas empedradas e as praças com laranjeiras dão-lhe um ar muito próprio.
Um dos seus símbolos é a Ponte Romana, uma ponte pedonal em pedra que atravessa o rio Gilão. Destacam-se também o seu castelo e as mais de 20 igrejas espalhadas pela cidade. As suas praias são paradisíacas e não estão sobrelotadas. É uma experiência altamente recomendável apanhar o comboio turístico para a Praia do Barril.
A viagem de oito minutos, com milhares de caranguejos a acenar enquanto passam pelos pântanos, é um prazer para os sentidos. Assim que chegamos à praia, do lado esquerdo, o cemitério de âncoras, com mais de 200 âncoras antigas, recorda-nos que esta é uma praia com história, onde os navios chegavam entre 1841 e 1966 com a sua pesca do atum até serem desmantelados, o que fez com que muitos marinheiros deixassem ali estas âncoras e o comboio passasse de transporte de mercadorias a turistas.
A outra praia, a Ilha de Tavira, só pode ser alcançada de barco a partir da cidade para desfrutar de uma ilha com quilómetros de areia branca que nunca fica cheia. Tavira é, sem dúvida, o sítio ideal para conhecer o Algarve mais autêntico.
Depois de 20 dias na estrada, descobrimos que o sudoeste e o sul de Portugal são perfeitos para quem procura aliar liberdade e natureza,** especialmente na costa vicentina e no Alentejo litoral, onde a paisagem selvagem e a tranquilidade contrastam com a agitação do Algarve.
O itinerário a partir de Lisboa, passando por praias praticamente intocadas e terminando na explosão turística do sul, oferece uma viagem completa que combina o mais puro da costa portuguesa com as vantagens de viajar sobre rodas.