A segunda cidade da República Checa não tem nada a ver com Praga: É peculiar, barata e "parece uma grande aldeia"
O meio-dia é 11 horas em Brno, assinalado pelo badalar do relógio astronómico que continua a ser um enigma até para os habitantes locais. De hora a hora, esta grande e erecta estrutura de granito negro lança um berlinde para um dos três pontos de recolha - normalmente guardado pelas mãos de crianças.
Todas as peças de arte e esculturas invulgares têm aqui um legado ou uma história popular que fala da coragem e da natureza alegre dos cidadãos de Brno.
Como muitos, nunca tinha ouvido falar da segunda cidade do sul da República Checa. Associava o país à movimentada capital e ao popular destino de despedida de solteiro, Praga.
Mas no comboio de uma hora e meia que me trouxe de Viena, a estudante universitária Ilona Szarazova diz-me: "Brno parece uma grande aldeia, toda a gente se conhece e nunca estamos stressados."
Rapidamente me apercebo de que as expectativas desfasadas e as peculiaridades inesperadas fazem parte do divertimento desta joia por descobrir.
Conhecer Brno: Mitos militares e inovação tecnológica
Caminhando para o centro da praça principal, a Praça da Liberdade, chego ao adorado relógio de Brno.
"Temos um bom sentido de humor", diz a guia local Sára Anna Hudcovicová. "Esta é a nossa versão do relógio mecânico medieval de Praga. Acho que é coincidência o facto de muitas das nossas esculturas se parecerem com um, sabe..."
De aspeto fálico, esta estrutura invulgar simboliza a bravura de Brno na sua defesa contra o cerco sueco em 1645 - razão pela qual foi concebida para se assemelhar a uma bala.
De acordo com o mito, os soldados suecos planearam desistir das tentativas de invasão um dia às 12 horas. Quando os habitantes locais descobriram, ajustaram os relógios da cidade para tocarem uma hora mais cedo.
Nada é exatamente o que parece aqui. Estou num dos principais centros de inovação tecnológica da Europa e, no entanto, sou seduzido pela arquitetura do período gótico tardio e pela elegância neo-renascentista da praça do Mercado dos Vegetais.
Entre as bancas que vendem ramos de flores secas outonais e cervejas da Oktoberfest, o ambiente é agradável mas não demasiado movimentado. Enquanto 13 universidades se encontram na área metropolitana circundante, apenas 400.000 pessoas vivem na cidade.
"Debaixo dos nossos pés há um labirinto de passagens e caves", diz Sára. "É possível ir até lá abaixo para ver onde eram armazenados os alimentos vendidos no mercado no século XIII."
A rica história de Brno: Catacumbas e estufas científicas
Entre os abundantes locais de convívio com espreguiçadeiras, parques cheios de bancos e fontes de água calmantes, há muitas atracções impressionantes. A segunda maior catacumba da Europa contém os restos mortais de 50.000 pessoas.
A 20 minutos a pé encontram-se os reservatórios de Žlutý Kopec, quatro tanques de água subterrâneos que foram encerrados em 1997 - e que este ano foram abertos aos turistas e a eventos musicais.
Embora datem de 1894, há algo de futurista na ilusão de espaço infinito criada por filas diagonais de pilares em cada câmara pouco iluminada.
A Estufa de Mendel, de onde surgiu a teoria da genética, uma catedral de 1770 e a Villa Tugendhat, do século XIII , classificada pela UNESCO, para citar alguns exemplos, estão aqui há muito tempo. Mas as fronteiras do país só se abriram aos turistas em 1989.
Praga teve uma vantagem após a revolução comunista, sendo uma cidade capital com um grande aeroporto. Mas Brno construiu o seu atrativo através de uma cuidadosa atenção aos pormenores da experiência da cidade.
As ruas são imaculadas, todas as pessoas com quem me cruzo falam inglês muito bem e é fácil deslocar-se - os eléctricos passam na estação de comboios de hora a hora, durante todo o dia.
Estou sempre a poucos passos de um café da moda ou de um bar animado que serve a melhor pilsner que alguma vez provei e há muitos restaurantes de alta qualidade que servem cozinhas globais.
Brno é um centro para nómadas digitais
Ao longo dos anos, a cena tecnológica ajudou a preparar o caminho para o turismo, trazendo empresas e receitas para Brno.
"Graças a iniciativas como o JIC, mais expatriados orientados para a tecnologia escolhem Brno", diz Ondřej Dufek, cofundador da Flatio, uma plataforma de aluguer de alojamento para nómadas digitais.
Criado há duas décadas, o JIC (Centro de Inovação da Morávia do Sul) foi uma das primeiras incubadoras tecnológicas na parte oriental da União Europeia.
Desde o seu lançamento em Brno, em 2016, a Flatio tem registado um aumento das reservas anuais. As conclusões preliminares do Relatório Nómada Digital 2024 da empresa classificam Brno em 10º lugar entre as 28 melhores cidades para trabalhadores remotos, a nível mundial.
Existem 15 espaços de co-working espalhados pela cidade e estão disponíveis alugueres de longa duração até um ano com o Flatio.
Posicionada em 123º lugar no recente índice do custo de vida europeu da Numbeo, também é fácil manter as coisas baratas enquanto se vive aqui.
Para além de Brno: Aldeias rústicas e caves de vinho
30 minutos de carro para sul e estou na Reserva Natural de Pálava. Da fortaleza em ruínas de 1200, no topo de uma colina rodeada de aldeias rústicas, admiro quilómetros de vinhas frutíferas junto ao reservatório de Věstonice.
Do outro lado da água fica Strachotin, uma das aldeias reconhecidas como património cultural da Morávia, devido ao beco das adegas por baixo das suas casas coloridas. É muito frequentada por ciclistas que param ao longo do reservatório para explorar a rede histórica de espaços subterrâneos de armazenamento de barris e provar os melhores vinhos brancos da região.
Embora pareça estar a um mundo de distância dos pontos turísticos, fica apenas a algumas horas de comboio de Viena, Praga e Budapeste. Embora Brno esteja a passar despercebida por enquanto, não permanecerá secreta por muito tempo - mas é por isso que é a altura ideal para descobrir esta cidade cheia de surpresas.