EU DECODED: como e por que motivo quer a UE enfraquecer o estatuto de proteção do lobo?
Hoje em dia, é possível encontrar lobos em quase todos os países da UE, com um aumento da população de 11 mil, em 2012, para mais de 20 mil no ano passado. A Itália, a Bulgária, a Roménia e a Espanha contam com mais de dois mil lobos cada uma.
A espécie, que esteve quase extinta em meados do século XX, recuperou após ter-lhe sido concedido o estatuto de "estritamente protegida" pela Convenção de Berna do Conselho da Europa, em 1982, e pela Diretiva Habitats, da UE, em 1992.
Mas os agricultores de alguns Estados-Membros da UE apelaram a uma revisão do estatuto de conservação do lobo e, no final de 2022, o Parlamento Europeu solicitou que o estatuto da espécie fosse alterado de "estritamente protegido" para "protegido".
Em virtude destes apelos, a Comissão Europeia propôs a alteração, aprovada pelos governos europeus este mês, que abre caminho para uma alteração da Diretiva Habitats, da UE.
"Uma espécie estritamente protegida não pode ser caçada, mas uma espécie protegida pode, e os lóbis agrícolas e os caçadores consideram-no necessário. Os grupos ambientalistas, por outro lado, estão preocupados com a caça excessiva e com o facto de o crescimento populacional a que temos assistido desde que a Convenção de Berna entrou em vigor poder vir a inverter-se e a culminar numa perda de população de lobos por toda a Europa", diz Robert Hodgson, que cobriu o processo legislativo para a Euronews.
Lobos contra gado e ciência contra política
De acordo com os dados da UE, os lobos matam cerca de 65 500 cabeças de gado por ano. A maioria, cerca de 73 %, é constituída por ovinos e caprinos. Tendo em conta que existem 60 milhões de ovinos em todo o setor, isto representa a morte de apenas 0,065% do gado.
"Na verdade, esta foi uma decisão com motivos políticos. Em 2022, a Suíça apresentou uma proposta ao Comité Permanente da Convenção de Berna para alterar o estatuto de proteção dos lobos e, nessa altura, a UE afirmou, de forma clara, que essa alteração não tinha quaisquer provas científicas ou razões de conservação que a apoiassem", afirma Sabien Leemans, responsável sénior pela política de biodiversidade da WWF.
A UE recolhe dados sobre os lobos de seis em seis anos, e existe um novo relatório previsto para 2026, mas o Partido Popular Europeu (PPE), um grupo de centro-direita do Parlamento Europeu, o partido que apresenta o maior número de deputados e que apoia fortemente o setor agrícola, afirma que existem provas suficientes.
"Penso que se trata de uma decisão baseada em dados científicos, uma vez que a população de lobos na Europa, no geral, já recuperou. E isto também pode ser visto como um sucesso da diretiva [Habitats], porque depois da introdução da diretiva em 1992, a espécie passou de praticamente extinta para mais de 25 mil espécimes", diz o eurodeputado italiano Herbert Dorfmann (PPE), membro e coordenador da Comissão de Agricultura e Desenvolvimento Rural.
Antes de apresentar a proposta, a Comissão recolheu dados e sondou a opinião pública, acabando por constatar que 70 % dos inquiridos se opõem ao enfraquecimento do estatuto de proteção dos lobos.
O governo espanhol foi um dos menos abertos a alterar a legislação e a Euronews foi ouvir a opinião de algumas pessoas em Madrid.
"Não podemos permitir que haja sobrepopulação dos lobos, isso tem de estar sob controlo, quer os ativistas dos direitos dos animais gostem ou não", disse um entrevistado. "Acho mal que reduzam a proteção ao lobo, porque o lobo é um símbolo espanhol muito forte e acho que faz o que lhe compete dentro do ecossistema", disse outro.
Há 50 anos que não se registam ataques de lobos a seres humanos na Europa, mas a coexistência pacífica continua a ser um desafio fora das reservas de conservação. Só o tempo dirá se esta medida irá levar a uma maior harmonia entre o ser humano e a fera.
Veja o vídeo aqui!
Jornalista: Isabel Marques da Silva
Produção: Pilar Montero López
Produção de vídeo: Zacharia Vigneron
Grafismo: Loredana Dumitru
Coordenação editorial: Ana Lázaro Bosch e Jeremy Fleming-Jones
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