Será que a parceria UE-Mercosul vai arrancar?

Muitos produtos da UE pagam atualmente elevados direitos de exportação para o bloco do Mercosul, constituído pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Alguns exemplos notáveis são os automóveis (35%), vinhos e bebidas espirituosas (até 35%), queijo (28%) e maquinaria (até 20%).
Com o Acordo de Parceria UE-Mercosul, estes direitos aduaneiros serão eliminados ou significativamente reduzidos, criando novas oportunidades para um mercado de 780 milhões de consumidores, que representa 25% do comércio mundial.
A Comissão Europeia acaba de apresentar uma proposta para o processo de ratificação do acordo político alcançado em dezembro de 2024. No entanto, os agricultores, os ambientalistas, alguns grupos do Parlamento Europeu e os Estados-Membros opõem-se ao acordo.
"É um empreendimento arriscado porque, se todo o acordo for ratificado pelos parlamentos nacionais, alguns deles podem opor-se ao texto, como já aconteceu no passado", explica Peggy Corlin, repórter sénior da Euronews para a política comercial.
"A Comissão Europeia decidiu separar a parte comercial da parte política, pelo que o Conselho dos Estados-Membros votará o texto por maioria qualificada. Será também votado pelo Parlamento Europeu por maioria simples, pelo que há mais hipóteses de ser implementado rapidamente", acrescentou.
A França, a Polónia e a Itália estão entre os Estados-Membros mais céticos, receando o impacto no seu importante setor agroindustrial. Para que o acordo comercial entre em vigor, é necessário que pelo menos 15 Estados-Membros, que representam 65% da população da UE, votem a favor do acordo.
O setor agrícola é um dos maiores críticos do acordo, razão pela qual a Comissão Europeia acrescentou recentemente salvaguardas num novo texto jurídico a anexar ao acordo. Estas incluem quotas que limitam as importações de produtos considerados mais sensíveis (como a carne de bovino, as aves de capoeira, o açúcar, o arroz e o mel) e um fundo de 6,3 mil milhões de euros para ajudar os agricultores afetados por crises de mercado.
Uma nova posição geopolítica depois do "America First"
Um dos fatores que contribui para uma ratificação mais rápida é a alteração da situação geopolítica desde o início das negociações com o Mercosul, há cerca de 25 anos.
"O parceiro comercial mais importante da América Latina passou a ser a China. Precisamos absolutamente de concluir este acordo também para nos tornarmos um parceiro comercial mais importante para a América Latina", afirmou Karel Lanoo, diretor executivo do Centro de Estudos de Política Europeia (CEPS), um grupo de reflexão sediado em Bruxelas.
"Depois do quase escandaloso acordo comercial entre a UE e os EUA, a UE pode ser vista como um parceiro pouco fiável", disse Lanoo sobre o acordo selado em agosto, que aumentará os direitos aduaneiros para 15% sobre cerca de 70% dos produtos da UE exportados para os EUA.
O acordo com o Mercosul também aumentará o acesso a matérias-primas essenciais, o que poderá ter um impacto significativo na indústria da UE. "É mais uma oportunidade para reduzirmos drasticamente a enorme dependência que temos da China, que se foi acumulando sem nos apercebermos", disse o analista do CEPS.
Um grupo de eurodeputados de esquerda lidera um projeto de resolução para bloquear o processo de ratificação do acordo com o Mercosul perante o Tribunal de Justiça Europeu, criticando a solução proposta pela Comissão Europeia.
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Jornalista: Isabel Marques da Silva
Produção de conteúdos: Pilar Montero López
Produção de vídeo: Zacharia Vigneron
Grafismo: Loredana Dumitru
Coordenação editorial: Ana Lázaro Bosch e Jeremy Fleming-Jones
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