Ministros da UE quebram impasse sobre redução de emissões até 2040 devido a pressão política
Os ministros europeus do Ambiente aprovaram, esta quarta-feira, uma revisão da lei climática da União Europeia, após a inclusão de várias flexibilidades destinadas a ajudar os Estados-membros a reduzir 90% das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) até 2040.
A legislação revista é um compromisso que a presidência dinamarquesa, que está a liderar o bloco da UE27, considerou necessário para fechar o acordo.
"Ouvimos e trabalhámos com todas as partes à volta da mesa, o que nos levou a um compromisso muito bom", disse aos jornalistas o Comissário Europeu para a Ação Climática, Wopke Hoekstra.
"Acordámos num objetivo juridicamente vinculativo para 2040 de -90%, com um objetivo nacional de 85% e até 5% de créditos internacionais. Reafirmámos as flexibilidades que colocámos em cima da mesa", explicou.
Os ministros concordaram com um maior volume de créditos poluentes para as indústrias, de forma a facilitar o caminho para a neutralidade climática até 2040, depois de um impasse político e de longas conversações na terça-feira à noite, que só permitiram um acordo forjad alcançado na quarta-feira de manhã.
O impasse ameaçou a capacidade do bloco de chegar a acordo sobre um objetivo climático vinculativo, visto por muitos como um enorme obstáculo à capacidade de prosperidade da indústria europeia.
O acordo alcançado fixou os créditos poluentes - os chamados créditos internacionais de carbono - num máximo de 5%, contra os 3% propostos pela Comissão Europeia. No entanto, outros 5% poderão ser considerados como parte de uma cláusula de revisão se o bloco se desviar da trajetória de redução de 90%.
A Finlândia, a Alemanha, os Países Baixos, Portugal, a Eslovénia, Espanha e a Suécia estão entre os países mais ambiciosos que pretendem manter o objetivo de 3% de créditos poluentes, enquanto França e Itália insistem em 5% e a Polónia em 10%.
Os ministros do Ambiente concordaram em manter o ano de 2036, proposto pelo executivo da UE, como a data de início da utilização dos créditos poluentes. No entanto, será considerado um período-piloto entre 2031 e 2035.
"O período experimental serve para mostrar a algumas partes que somos a favor da utilização destes créditos, mas pode sair pela culatra. É necessário que seja apoiado cientificamente", disse um diplomata da UE à Euronews.
Os créditos de carbono são certificados negociáveis que a indústria pode utilizar para compensar parte das suas emissões e criar incentivos financeiros para reduzir a poluição.
Cada crédito representa uma tonelada métrica de CO2 reduzida ou retirada da atmosfera. Os grupos ambientalistas opõem-se veementemente aos créditos de carbono, argumentando que estes não reduzem a poluição, limitando-se a transferi-la para países com rendimentos mais baixos.
Para chegar a um acordo sobre o objetivo climático para 2040, os países mais ambiciosos tiveram de fazer concessões, que alguns consideraram "bastante dolorosas", segundo os diplomatas da UE, mas necessárias para alcançar uma maioria qualificada, essencial para a concretização de um acordo.
A Chéquia, a Hungria, a Eslováquia e a Polónia não apoiaram a revisão da lei. A Bélgica e a Bulgária abstiveram-se.
A UE está a rever a Lei Europeia do Clima, que estabelece o caminho para a neutralidade climática até 2050, em relação aos níveis de 1990. A lei exige que a UE estabeleça um objetivo climático para 2040, a fim de colmatar a lacuna entre os objetivos climáticos para 2030 e 2050.
Vários países da UE receiam que os esforços para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa até 2040 prejudiquem significativamente a competitividade das indústrias europeias. Políticas climáticas mais rigorosas e regulamentações ambientais mais rígidas aumentam os custos de produção, especialmente para setores de energia intensiva como o aço, argumentam.
De acordo com a lei climática do bloco, o objetivo é descarbonizar os processos tradicionais da indústria pesada através de tecnologias como a captura de carbono e a eletrificação. As tecnologias limpas, como as bombas de calor e os veículos elétricos, também fazem parte do processo de descarbonização gradual da economia do bloco.
Muitos países da UE com bom desempenho na produção de energia limpa ou, de um modo geral, no bom caminho para atingir a neutralidade climática, apoiam o objetivo climático para 2040, mas outros são mais cautelosos.
Ao mesmo tempo, o bloco está sob pressão para chegar à cimeira das Nações Unidas sobre o clima, a COP30, na próxima semana, com uma posição clara e ambiciosa, uma vez que o objetivo climático interno da UE servirá de base para o cálculo do objetivo climático do bloco para 2035, que deverá ser apresentado na cidade brasileira de Belém.
Condições políticas favoráveis
Os créditos internacionais de carbono, as remoções de carbono e uma cláusula de revisão estão entre as flexibilidades que ajudaram a concretizar o acordo de quarta-feira, apesar dos Estados-membros mais ambiciosos terem manifestado preocupações quanto à credibilidade do bloco aos olhos dos investidores que precisam de certeza política para desbloquear a tecnologia limpa.
As últimas alterações ao texto, a que a Euronews teve acesso, incluem também um travão de emergência, proposto por França, relacionado com as emissões e remoções de CO2 provenientes de atividades relacionadas com o solo. No entanto, esta medida só pode ser invocada cinco anos após a entrada em vigor da lei.
Com o declínio do estado das florestas e o fraco desempenho das tecnologias de captura e armazenamento de carbono, o travão de emergência procura encontrar outras formas dos países da UE compensarem as emissões que os sumidouros naturais de carbono poderiam cobrir.
"Precisamos de ter expetativas realistas sobre o contributo que as remoções de CO2 dos solos e das florestas podem dar... É necessário salvaguardar que outros setores não possam cobrir as carências deste setor", afirmou um diplomata da UE.
"O risco de não ter uma Lei Europeia do Clima é maior do que ter uma cláusula de revisão", disse na terça-feira um diplomata de um país ambicioso, salientando a pressão para adotar uma posição.
Após meses de impasse, os países mais ambiciosos acreditam que a revisão da lei europeia do clima é fundamental para que a UE possa finalmente chegar a acordo sobre um objetivo climático global a apresentar na COP30.
"Se conseguirmos uma lei climática com 90% podemos viver com um intervalo para a meta climática de 2035 a apresentar na COP30", disse um diplomata da UE, referindo-se à declaração de intenções com um intervalo entre 66,25% e 72,5% que os ministros do ambiente da UE acordaram em setembro.
Equilíbrio entre clima, defesa e competitividade
Apesar de apoiar a revisão da legislação comunitária em matéria de clima, o ministro alemão do Ambiente, Carsten Schneider, afirmou que a votação de quarta-feira era uma questão de autodeterminação e autossuficiência para a UE, sublinhando os desafios de competitividade que o bloco enfrenta.
"Por um lado, somos desafiados por um grande parceiro, os EUA, que disse adeus à política internacional de proteção do clima. Por outro lado, temos de lidar com a China do ponto de vista da competitividade", disse Schneider aos jornalistas.
O ministro alemão defendeu que a UE precisa de estar na vanguarda das tecnologias limpas e das inovações, salientando que estas beneficiarão os mercados futuros.
"A combinação da proteção ambiental, da política de proteção do clima e da política económica é fundamental", acrescentou o ministro alemão.
O ministro do Ambiente da Chéquia, Petr Hladík, afirmou que as economias dos países centrais e orientais enfrentam dificuldades e insistiu na neutralidade tecnológica para que os Estados-membros possam utilizar os meios mais eficientes em termos de custos para atingir os objetivos climáticos.
"Devemos também ter em conta que, em alguns países, a percentagem de indústrias difíceis de descarbonizar - química, aço, cimento, vidro - é elevada. Nestes setores, as tecnologias não estão suficientemente avançadas", acrescentou Hladík.
Para além do delicado equilíbrio entre a competitividade e a ambição climática, a Roménia recordou a atual situação geopolítica, observando a "guerra sangrenta" nas fronteiras da UE e da Roménia, e o quanto a paisagem mudou desde que a lei climática foi adotada em 2021.
A atual situação geopolítica "exige que os cidadãos e as empresas cubram as despesas de defesa que aumentaram exponencialmente num curto período de tempo", disse a ministra romena do Ambiente, Diana-Anda Buzoianu.
A votação de terça-feira desbloqueou um impasse político a nível do Conselho, abrindo a porta ao Parlamento Europeu para deliberar sobre o assunto.
Os legisladores do Parlamento Europeu vão agora votar o objetivo climático para 2040 e continuar as negociações com os países da UE.
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