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Estado de direito deteriora-se em toda a UE, segundo relatório

• Mar 17, 2025, 8:01 AM
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O relatório sobre o Estado de direito das liberdades - publicado esta segunda-feira pela União das Liberdades Cívicas para a Europa - revela que, embora a situação varie de um Estado-membro para outro, existe uma tendência geral e fundamental para que o Estado de direito tenha sido fortemente desafiado nos últimos anos.

O relatório de 1000 páginas é publicado anualmente e a sua sexta edição, lançada este ano, é o resultado da colaboração entre 43 organizações de direitos humanos de 21 países da UE, coordenadas pela União das Liberdades Cívicas para a Europa.

Uma das conclusões mais marcantes da investigação da organização é a persistência das violações registadas e a deterioração global do Estado de direito em toda a UE. Embora os países apresentem variações, a observação mais geral é que todos os aspetos fundamentais do Estado de direito - nomeadamente, o sistema judicial, as medidas anticorrupção, a liberdade dos meios de comunicação social, os controlos e equilíbrios, o espaço cívico e os direitos humanos - enfrentaram desafios semelhantes e cada vez maiores nos últimos anos.

Isto revela claramente deficiências persistentes e sistémicas no Estado de direito em todo o bloco.

"Vemos um grande número de países onde o Estado de direito continua a diminuir, nomeadamente em Itália, na Eslováquia, na Roménia e na Hungria. A razão subjacente a esta situação é o facto de a UE não ser suficientemente forte nas suas respostas ao declínio do Estado de direito. Se as violações do Estado de direito são permitidas, mesmo que tacitamente, isso encoraja os líderes governamentais a deteriorar ainda mais o Estado de direito", disse à Euronews Viktor Z. Kazai, especialista sénior em Estado de direito na União das Liberdades Cívicas para a Europa e um dos autores do relatório.

Países separados em diferentes grupos

Os "estagnadores" são países que permaneceram estáticos ou registaram progressos mínimos nos seus indicadores do Estado de direito. A Grécia, a Irlanda, Malta, os Países Baixos e Espanha pertencem a este grupo.

Os "sliders" são democracias-modelo como a Bélgica, França, Alemanha e a Suécia, que registaram declínios isolados, mas ainda assim preocupantes, em certos domínios.

Os "desmanteladores" são países onde o Estado de direito é sistemática e intencionalmente minado em quase todas as áreas, sendo este grupo constituído pela Itália, Bulgária, Croácia, Roménia e Eslováquia. O elo mais fraco, e reincidente, foi a Hungria.

Alguns países revelaram tentativas notáveis de melhorar a situação do Estado de direito a nível interno. Os "trabalhadores esforçados" - a Estónia e a Chéquia - mostraram sinais de esforços genuínos e sistémicos para melhorar a situação, destacando o papel bem-sucedido da sociedade civil na criação de mudanças positivas.

A Polónia, por seu lado, é considerada um "conto de advertência", uma vez que o novo governo tentou restaurar a independência judicial e o pluralismo dos meios de comunicação social sem conseguir grandes progressos, o que demonstra que a resolução do problema do comprometimento da independência das instituições é um esforço extremamente difícil e frágil.

De acordo com o relatório, é absolutamente crucial que a Comissão Europeia associe o relatório anual sobre o Estado de direito aos mecanismos de aplicação do Estado de direito, como os processos por infração ao artigo 7.º para os Estados-Membros que não respeitem os valores europeus ou a condicionalidade da UE.

Principais conclusões

De acordo com o relatório, o sistema judicial continua a sofrer de manipulação política, recursos insuficientes e barreiras à assistência jurídica, fatores que prejudicam a sua independência, qualidade e eficiência.

O panorama geral mostra também que, no domínio da luta contra a corrupção, persiste uma falta de transparência, uma fraca aplicação da lei e uma proteção inadequada dos denunciantes, o que leva a uma erosão da confiança na integridade do governo.

A liberdade dos meios de comunicação social continua ameaçada em muitos países, uma vez que a influência política compromete a independência dos organismos reguladores e a concentração da propriedade sufoca o pluralismo, com os jornalistas a enfrentarem cada vez mais assédio e desafios legais.

Os controlos e equilíbrios são ainda mais enfraquecidos pelo recurso excessivo a processos legislativos acelerados, pela interferência política em autoridades independentes e pela integridade comprometida do sistema eleitoral, fatores que corroem o controlo democrático e legal sobre o governo.

Além disso, os espaços cívicos continuaram a diminuir à medida que as campanhas de difamação generalizadas encorajam os governos a adotar leis restritivas, em especial no que se refere ao direito de protesto pacífico e à liberdade de reunião e de associação.

Por último, os direitos humanos estão sujeitos a uma pressão crescente devido a políticas de migração mais rigorosas, a uma proteção inadequada dos grupos vulneráveis e ao aumento da discriminação e do discurso de ódio que afeta as minorias em toda a região.

Desafios internacionais

Como referem os autores do relatório, estes desafios internos estão a desenrolar-se num cenário geopolítico em mutação, com o aumento do populismo de extrema-direita, o retrocesso democrático nos EUA e os conflitos globais a moldarem a trajetória política da Europa.

A influência crescente da extrema-direita ameaça a unidade da UE, enquanto a guerra da Rússia contra a Ucrânia e o declínio do apoio transatlântico à segurança europeia põem à prova a capacidade de resistência do bloco. As políticas de migração estão a tornar-se mais duras, com os Estados a apertarem as fronteiras e a restringirem os direitos de asilo, muitas vezes em violação do direito internacional. Entretanto, os mecanismos de aplicação da UE continuam a ser fracos, o que tem permitido que as tendências iliberais se instalem em vez de enviar uma mensagem clara sobre a centralidade do Estado de direito e dos direitos fundamentais. Sem uma ação decisiva, a UE arrisca-se a uma maior erosão democrática, a uma fragmentação interna e a uma posição global enfraquecida.

"À medida que o populismo de extrema-direita aumenta e a democracia recua nos EUA, a crise do Estado de direito na Europa agrava-se. A crescente influência da extrema-direita ameaça a unidade da UE, enquanto a guerra da Rússia na Ucrânia e a rápida transformação dos laços transatlânticos põem à prova a capacidade de resistência do bloco. Para salvaguardar a UE e o mundo baseado em regras, a Comissão Europeia deve reforçar a aplicação do Estado de direito, ligando-a diretamente ao artigo 7.º, à condicionalidade orçamental e aos processos por infração", diz o relatório.