Casas em Portugal são das mais sobrevalorizadas, segundo relatório da Comissão Europeia

O relatório da Comissão Europeia, "Habitação na União Europeia: evolução do mercado, fatores subjacentes e políticas", publicado na terça-feira, mostra que os preços das casas, nos últimos dez anos, tiveram uma subida drástica em toda a União Europeia e Portugal está na lista dos países onde as casas são mais sobrevalorizadas.
As taxas de juros mais altas, a procura por habitação por parte de famílias mais ricas e investidores; a urbanização; a migração e mudanças nas estruturas familiares; o aumento de arrendamentos de curta duração; a falta de construção nova e a escassez de mão de obra na área da construção contribuem para o atual estado da habitação na União Europeia.
Entre 2014 e 2024, os preços das habitações na UE aumentaram, em média, 50 %, "mas na Hungria, Lituânia, Chequia, Portugal, Estónia, Bulgária e Polónia, o crescimento nominal dos preços das habitações excedeu 200 %", revela o relatório.
Os investigadores estimam que a valorização dos preços das casas acima do valor real médio é mais significativa em Portugal. “Estima-se que os preços estejam sobrevalorizados em cerca de 35 % em Portugal, sendo este o único país onde se estima que a sobrevalorização tenha aumentado significativamente em 2024.”
Turismo e arrendamento de curta duração
Há diversas razões que justificam o preço inflacionado das casas em Portugal e há fatores mais proeminentes do que outros. Segundo o relatório da Comissão Europeia, o turismo e o arrendamento de curta duração são alguns deles.
"O aumento dos arrendamentos de curta duração em áreas turísticas está intimamente relacionado com o aumento dos preços das casas e das rendas", concluem os investigadores.
O aumento das plataformas de partilha de casas, como o Airbnb, perturbou o mercado imobiliário tradicional, uma vez que contribui para a diminuição da oferta no mercado de arrendamentos de longa duração.
“Há cada vez mais evidências empíricas que sugerem que o aumento do turismo em geral e o aumento das plataformas de partilha de casas em particular contribuíram para um aumento das rendas e dos preços da habitação em algumas localizações privilegiadas, como os centros históricos das cidades”, conclui o estudo.
Portugal é o país da UE onde o turismo teve o “maior impacto nos preços das habitações”, afirma o relatório.
Este é um problema também em países como a Espanha, em que a turistificação é um problema nas grandes cidades, como Barcelona, e já foram tomadas medidas.
Investimentos institucionais
Em Portugal , a taxa do parque habitacional público é uma das mais baixas da Europa, representando cerca de 2% do total, de acordo com os últimos dados do estudo feito pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa – “O Estado da Nação e as Políticas Públicas 2025”.
Esta realidade aliada a outro fator expresso no relatório da Comissão Europeia ajuda a explicar a crise no setor. “Em algumas áreas urbanas, parte do parque habitacional é propriedade de empresas, e o longo período de taxas de juros baixas contribuiu para o aumento da procura por parte de investidores institucionais.”
O relatório afirma que investidores institucionais, como seguradoras e fundos de pensões, “desempenharam um papel importante no aumento dos preços imobiliários na última década, particularmente nas capitais globais”.
Em Portugal, os fundos de pensão têm “uma exposição significativa”.
Também a emissão de licenças de construção é um problema para o aumento do parque habitacional público e, em países como Portugal, Croácia, Espanha e Grécia, caiu drasticamente após a crise financeira global. Nestes países, "as licenças de construção estão próximas de mínimos históricos."
A burocracia morosa para o licenciamento de construção pode explicar também a falta de habitação. “ Na maioria dos países da UE, existem prazos fixos para a emissão da licença, que variam entre 3 semanas na Lituânia e 31 semanas em Portugal.”
Para além disso, “o processo de licenciamento em alguns países é sobrecarregado por requisitos de documentação complexos, o que pode criar atrasos desnecessários e encargos administrativos”. Uma revisão desses requisitos, com vista à sua simplificação — como a redução do número ou da complexidade dos documentos exigidos, quando apropriado — poderia contribuir para uma maior eficiência”, conclui o estudo.
Imóveis devolutos
A quantidade incalculável de imóveis devolutos também está na ordem do dia quando o tema em discussão é a habitação em Portugal e também o relatório europeu vai ao encontro desta questão. "A questão dos imóveis devolutos representa um desafio significativo em toda a UE, estimando-se que aproximadamente um em cada seis imóveis esteja devoluto em toda a Europa."
E mais uma vez, Portugal aparece no topo da lista de países em que há mais imóveis devolutas, a par com a Bulgária, Roménia, Malta, Chipre e Hungria.
A análise pelos investigadores europeus sugere que a elevada percentagem de imóveis devolutos em algumas grandes cidades contribui bastante para a escassez de habitação.
Portugal e a crise da habitação
Este tem sido um tema constante na política portuguesa e uma crítica aos últimos governos com manifestações a acontecerem frequentemente pelo aumento das rendas e pela inexistência de habitação acessível.
Entre as medidas apresentadas, destaca-se um novo incentivo fiscal dirigido à construção, há muito reivindicado pelo setor: uma redução do IVA para 6% para construção até 648 mil euros. A taxa de IVA de 6% vai aplicar-se também a arrendamentos até ao valor de 2300 euros. Ou seja, à construção para arrendar até este valor.
Sobre este limite dos 2.300 euros no arrendamento, o primeiro-ministro esclareceu que na base desta decisão estão "áreas de maior pressão", como Lisboa, Porto e outros concelhos onde os montantes médios são superiores a este.
A maioria das medidas é de âmbito fiscal, pelo que está dependente da aprovação do Parlamento, mas há também várias alterações no setor do arrendamento.
Em junho, a Comissão Europeia tinha alertado para o facto de que os governos portugueses não estão a ser eficazes na resposta à crise no setor da habitação e recomendou medidas concretas, nomeadamente o controlo de rendas ou a imposição de limites ao alojamento local.
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