Governo português procura "base de apoio parlamentar sólida" para reconhecer Estado da Palestina

O reconhecimento da Palestina por Portugal ganhou um novo impulso com o início das consultas aos partidos políticos esta semana. Numa fase mais assertiva da política externa, o país procura alinhar-se com o crescente reconhecimento internacional da Palestina.
No final de setembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas volta a ser palco de esforços diplomáticos para reforçar o reconhecimento internacional da Palestina como Estado soberano. Portugal demonstrou, desde julho, a intenção de integrar este movimento, destacando o seu apoio de longa data à autodeterminação do povo palestiniano.
Sob liderança do ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, o país reforçou a sua posição em defesa da criação de dois Estados, após uma reunião em fevereiro com o homólogo israelita Gideon Sa'ar, em Jerusalém, no âmbito de um périplo pelo Médio Oriente. Esta visão foi reafirmada em Copenhaga, durante uma reunião com homólogos da União Europeia (UE), onde o ministro frisou o papel diplomático que Portugal pretende assumir no processo de paz.
O envolvimento português surge num momento em que vários Estados-membros da União Europeia procuram reafirmar uma visão mais proativa na resolução do conflito no Médio Oriente. O reconhecimento por parte de Portugal posiciona o país entre os que veem nesta posição uma ferramenta de pressão concreta para o reequilíbrio diplomático entre Israel e a Palestina.
Além disso, o movimento nacional dá continuidade à postura da União Europeia em defesa do direito internacional e pode fortalecer o papel europeu como mediador na região.
No final de julho, o primeiro-ministro Luís Montenegro anunciou que o Governo iria ouvir o Presidente da República e os partidos com representação parlamentar com vista a "considerar efetuar o reconhecimento palestiniano" na semana de Alto Nível da 80.ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, entre 23 e 29 de setembro.
"As conversações com o Presidente da República já tiveram lugar, agora faltam as consultas aos grupos parlamentares, esta semana pelo menos três", disse à Lusa o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, à margem da reunião ministerial dos países da UE, em Copenhaga, na Dinamarca.
O governante revelou que as reuniões fazem parte de encontros preparatórios não só por causa desta questão, mas também do Orçamento do Estado e da lei da nacionalidade, mas refletem uma clara preocupação em construir uma base de apoio parlamentar sólida para o reconhecimento da Palestina por Portugal.
Sobre a possibilidade de sancionar os "colonos israelitas", que também ocupam território palestiniano na Cisjordânia, o ministro português assumiu que "há muita margem para progredir", e também no acordo de associação com Israel, que estabelece as bases para as relações comerciais e de cooperação entre a União Europeia e Israel, fundamentadas no respeito por direitos humanos e princípios democráticos.
Recentemente, a UE iniciou uma revisão deste acordo devido a preocupações com o não cumprimento do Artigo 2.º, que consagra esses princípios, especialmente no contexto da situação em Gaza. Em resposta a estas preocupações, a Comissão Europeia propôs uma suspensão parcial da participação de entidades israelitas em atividades financiadas pelo Acelerador do Conselho Europeu da Inovação (CEI).
"Somos favoráveis a que houvesse sanções, não digo totais – uma vez que o consenso é difícil –, mas ter algumas. Seriam sinais importantes de pressão sobre o Governo israelita para parar esta ofensiva que está a ser feita agora em Gaza, seja os entraves à chegada de ajuda humanitária, seja também o plano para os novos colonatos na Cisjordânia, que é extremamente preocupante", defendeu Rangel.
Estas ações fariam parte de uma abordagem coordenada para travar a expansão territorial de Israel e impulsionar o respeito pelos direitos humanos nos territórios palestinianos.
Qual a posição dos partidos políticos sobre o reconhecimento da Palestina?
As consultas aos partidos com assento parlamentar arrancaram esta quarta-feira. O primeiro partido a ser ouvido foi o Chega, seguido da Iniciativa Liberal e do Livre. Segundo uma nota do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o PSD também será recebido esta quarta-feira. O Governo reúne depois com o Partido Socialista (PS) esta sexta-feira, dia 5 de setembro, e com o PCP daqui a uma semana, a 10 de setembro. Os encontros prosseguem com os outros partidos nos dias seguintes.
Da parte do executivo, as reuniões contarão com a presença dos ministros das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, da Economia e Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, da Presidência, António Leitão Amaro, e dos Assuntos Parlamentares, Carlos Abreu Amorim.
Aos jornalistas, à saída da reunião, Rita Matias, deputada do Chega, assumiu que o partido entende que a "solução" para o conflito no Médio Oriente "passa pela existência de dois Estados", no entanto, tem "algumas dúvidas e preocupações relativamente àquilo que são as condições que o Governo diz ter asseguradas" para o reconhecimento da Palestina como Estado soberano.
"Desde logo as conversações com a autoridade palestiniana de que o Hamas será desmantelado e que não se organizará como força política, isto parece-nos fundamental, no entanto estamos mais céticos do que o Sr. Ministro de que isto realmente seja possível", afirmou a parlamentar do Chega.
Por essa razão, referiu Rita Matias, "o grupo parlamentar do Chega entendeu dizer que por ora não é tempo de reconhecer o Estado palestiniano, acompanhando também outras posições mais conservadoras relativamente a este tema, nomeadamente a nível europeu".
Seis partidos da oposição com representação no Parlamento já manifestaram, anteriormente, ser a favor de que Portugal reconheça o Estado da Palestina. O PCP, Bloco de Esquerda (BE), Livre, Pessoas, Animais e Natureza (PAN), Juntos Pelo Povo (JPP) e PS defenderam que tal é uma solução para o conflito israelo-palestiniano e que esse reconhecimento deve ter em conta as fronteiras anteriores a 1967 e com capital em Jerusalém Oriental.
Por seu lado, o CDS-PP rejeitou até agora o reconhecimento do Estado palestiniano, argumentando que, primeiro, têm de ser respeitados pressupostos, como o fim do Hamas, o acordo de cessar-fogo e a libertação de todos os reféns ainda em poder do movimento de resistência palestiniano.
Já a Iniciativa Liberal (IL) recomendou ao Governo uma "estratégia equilibrada e responsável para promover uma solução pacífica e sustentável para o conflito israelo-palestiniano".
O partido também entende que o reconhecimento do Estado da Palestina deve ser feito num movimento multilateral, porque Portugal fazê-lo individualmente não faria diferença.
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